utopia e realidade
| Já se disse que a melhor oportunidade para abordar problemas de absoluta relevância, é quando eles passam a afetar todas as pessoas. Os dias que estamos vivendo, de intranqüilidade, de medo e falta de perspectivas imediatas para a obtenção da paz no mundo, conduz-nos a reflexões mais profundas sobre a responsabilidade de cada um no processo de reversão da situação incômoda que aflige toda a humanidade. É uma constatação irrefutável de que o mundo vive, no início deste século, uma situação do profundo desequilíbrio, com lutas internas – impedindo o progresso e o desenvolvimento de nações inteiras – conflitos culturais e religiosos, guerras pela conquista do poder, tudo isso agravado pelo recrudescimento do terrorismo, uma nova forma sangrenta de contestação, sacrificando inocentes, promovendo danos materiais vultosos, com o único objetivo de chamar a atenção para as idéias dos que se julgam detentores da verdade suprema e inquestionável. A situação no Rotary No ambiente rotário, começa a surgir uma consciência crítica que, muitas vezes, tende a duvidar do poder do cidadão comum de promover mudanças, levando-o a um estado de descrença por julgar-se impotente para uma tarefa de tão grandes proporções como a da conquista da paz no mundo. Pergunta-se, muitas vezes, se não passa de mera utopia uma organização dos moldes do Rotary – sem poder político, sem penetração explícita nos meandros da administração pública ou da diplomacia formal, valendo-se apenas da capacidade de persuasão e do prestígio pessoal daqueles que compõem seus quadros sociais – poder fazer algo, realmente útil e proveitoso para diminuir conflitos, buscar o entendimento entre povos e nações, cumprindo o seu nobilitante objetivo final. Essa atitude realista é própria de homens e mulheres que não se contentam em ser apenas observadores do que acontece, mas que ampliaram a sua visão e sentem-se responsáveis por dar alguma contribuição válida para que se encontre os melhores caminhos para uma convivência pacífica em todos os lugares. A programação anual do Rotary International, ao designar fevereiro, o mês da sua fundação, como o dedicado à Compreensão Mundial, deseja trazer à nossa reflexão o papel que nos cumpre desempenhar na obtenção do entendimento e da paz, e tem como escopo principal chamar a atenção dos rotarianos para a situação de intranqüilidade reinante em todo o mundo, para que possam situar-se, adequadamente, no nível das suas responsabilidades individual e coletiva. Choques culturais Hoje, está predominando o conceito de que as guerras são, essencialmente, um choque de culturas, um conflito de civilizações. Estão diminuindo de importância as lutas por expansão territorial e pela imposição de ideologias. Avultam-se, no entanto, os problemas causados pela pobreza, pelo analfabetismo, pela falta de perspectiva e o distanciamento, cada vez maior, entre os que têm muito e os que não têm nada. As dissensões estão sendo causadas pela exploração da indigência mental de milhões de pessoas, sem autodeterminação, sujeitas a serem conduzidas por líderes carismáticos que exploram essa indigência para satisfazer os seus apetites insanos de dominação. Por outro lado, a disponibilidade de armas de destruição em massa, manejadas por fanáticos, está criando novas formas de guerra, que não envolvem países, especificamente, mas que semeiam a intranqüilidade e o pavor entre as populações, transformando, todos, em reféns, ao desafiarem os mais avançados sistemas de defesa convencionalmente organizados. Atitude a adotar Esse clima de insegurança nos faz repensar a nossa atitude em face dos descalabros que estão desafiando a capacidade de bem servir. Como rotarianos, e cidadãos do mundo, urge reforçar as nossas convicções. O que nos prende à nossa organização é a consciência de que podemos dar às nossas vidas um sentido de utilidade plena, absorvendo as tendências que nos orientam desde os seus primórdios, esforçando-nos para que nos situemos na dinâmica dos novos tempos que estamos vivendo. Há alguns conceitos básicos que o Rotary, como organização, deve expressar de maneira corporativa, refletindo o pensamento dos que militam em seus quadros. É tempo de adotarmos uma atitude que demonstre a sua verdadeira índole para que governos, autoridades responsáveis e as pessoas comuns, saibam que os homens e mulheres que abraçaram o idealismo do Rotary, não desejam, apenas, servir de exemplos de respeito aos ditames da ética, submetidos à lei e à ordem. Chegamos à conclusão de que não basta, apenas, proclamarmos os nossos propósitos. É preciso lutar para que eles prevaleçam, tomando atitudes corajosas, com respaldo na força moral conquistada nestes quase 100 anos de atuação voltada para promover o bem comum e a paz. Não pode existir nenhuma dúvida de que os desacertos de âmbito mundial são da responsabilidade de todos e de cada um. Embora não tenhamos o propósito de encontrar soluções atrevidas para os complexos problemas que nos afligem, que são da competência dos diplomatas e dos estadistas, precisamos fazer chegar até eles a nossa preocupação e a nossa inconformidade com a persistência dos desentendimentos reinantes, estimulando-os e apoiando-os para que encontrem soluções compatíveis com os anseios de todas as pessoas. Programas humanitários Além disso, cumpre-nos ampliar os nossos programas de Bolsas de Estudos Pró Paz e soluções de conflitos; Bolsas dos Embaixadores da Boa Vontade e Intercâmbios de Grupos de Estudo, nossos programas humanitários, para atingir a raiz das dissensões, como a fome, o analfabetismo, a falta de abrigo e água potável. Há muitos séculos, o grande profeta Isaias, ao ver que o mundo estava doente e tenso, legou-nos a seguinte receita: “Alarga o lugar de tua tenda... Amplia as suas cordas e fortifica suas estacas”. Do lugar onde estamos, fortalecidos pelo idealismo pragmático do Rotary, podemos lançar as nossas cordas para alcançar este mundo de insensibilidade e falta de compaixão, dando a nossa contribuição generosa em favor da compreensão e da paz. O grande escritor e diplomata mineiro, o cidadão universal Guimarães Rosa, deixou-nos estas palavras que refletem, bem, a nossa responsabilidade nos dias atuais: “Cada homem tem um lugar no mundo e no tempo que lhe é concedido. Sua tarefa nunca é maior do que a sua capacidade para poder cumpri-la”. Archimedes Theodoro |
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